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Bebês Reborn: Entre o Real e o Imaginário, o Fenômeno que Divide Opiniões

Por Thamyris Nagell 

O mundo hiper-realista dos bebês reborn — bonecos meticulosamente confeccionados para imitar recém-nascidos — saiu das mãos de artistas e colecionadores para se tornar centro de um debate que mistura arte, saúde mental, economia e direito. O que começou como um objeto afetivo ou decorativo ganhou dimensões inesperadas: creches exclusivas para reborns, disputas judiciais de “guarda” em separações conjugais e até tentativas frustradas de atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Esses bonecos são criados com tamanha precisão que replicam características reais de um bebê: peso, textura da pele, marcações vasculares, cabelo implantado fio a fio e até cheiro. Para alguns, são apenas obras de arte; para outros, representam laços emocionais profundos — e, por isso mesmo, começaram a gerar situações complexas que desafiam as fronteiras entre o simbólico e o real.


Impactos Econômicos: Um novo Mercado Lucrativo
A princípio um nicho artesanal, os reborns hoje movimentam um mercado robusto e pouco regulado. Bonecos de alto realismo podem custar entre R$ 500 e R$ 10 mil. Mas o que chama atenção é a expansão do setor para além da venda dos bonecos: surgiram creches especializadas para reborns, onde os “bebês” passam o dia sendo cuidados como se fossem reais, com trocas de roupa, mamadeiras e até rotinas de sono.

Lojas de enxoval, berçários fictícios, seguros e certidões simbólicas de nascimento também compõem esse universo econômico singular — que explora o vínculo emocional que muitas pessoas desenvolvem com os bonecos.

Com o aumento da demanda, surgiram também falsificações e a exploração do trabalho informal, com artistas artesanais sendo prejudicados por produções em larga escala, muitas vezes feitas em condições questionáveis. A ausência de regulamentação específica para esse nicho de mercado dificulta a fiscalização muitas vezes sem padrão de qualidade ou segurança e prejudica a valorização dos trabalhos originais e éticos.

Desdobramentos Jurídicos: Lacunas legais e Até Onde Vai a Realidade?

Tal realismo e carga afetiva vêm gerando situações jurídicas atípicas. O vínculo afetivo, por mais intenso que seja, não encontra respaldo legal quando ultrapassa os limites da ficção. Um caso recente chamou a atenção da Justiça brasileira: uma mulher entrou com ação judicial pedindo que o SUS oferecesse atendimento pediátrico para seu bebê reborn, alegando motivos emocionais. A Justiça negou o pedido, afirmando que o boneco não tem personalidade jurídica nem necessidades reais de saúde.

O caso escancarou a tensão entre empatia e racionalidade jurídica. Embora o Judiciário reconheça a importância do cuidado com a saúde mental, o pedido foi interpretado como um desvio de função dos serviços públicos — já sobrecarregados com demandas reais e urgentes.

Ainda no campo jurídico, surgem episódios igualmente incomuns. Casais em processo de separação têm entrado em disputa por quem ficará com o reborn — e, mesmo que não exista previsão legal sobre guarda de objetos afetivos, o Judiciário, por vezes, precisa se posicionar. Em alguns casos, a posse do boneco é tratada com o mesmo cuidado dado a bens de valor emocional significativo, ainda que não haja criança envolvida.

Outro ponto delicado envolve o uso de imagens de crianças reais na criação de bonecos personalizados sem autorização dos responsáveis, o que pode violar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

A Fronteira Emocional
No campo psicológico, o uso de reborns tem duas faces. De um lado, especialistas reconhecem seu potencial terapêutico em contextos clínicos: mulheres em luto gestacional, pessoas com depressão ou idosos com demência podem se beneficiar de forma simbólica ao interagir com os bonecos, desde que isso seja acompanhado por profissionais.

Por outro lado, o apego excessivo e a substituição de vínculos reais por uma figura inanimada podem acentuar quadros de ilusão ou isolamento emocional. Em crianças pequenas, a exposição contínua a vídeos e conteúdos onde os bonecos são tratados como reais pode gerar confusão cognitiva, especialmente quando não há clareza de que se trata de ficção.

Celebridades e Redes: Likes Acima da Responsabilidade?
Nas redes sociais, o universo dos reborns encontrou palco fértil. Várias celebridades têm se envolvido com o universo dos bebês reborn, algumas por interesse pessoal e outras como parte de estratégias de marketing. Influenciadores digitais, em especial, popularizaram vídeos de “rotina de cuidados” com reborns, atraindo milhões de visualizações, mas também duras críticas. O conteúdo, muitas vezes voltado para o público infantil, levanta discussões sobre exploração comercial e exposição indevida de temas delicados.

Em contrapartida, alguns famosos se posicionaram de forma crítica, denunciando o uso exagerado ou mal-intencionado dos reborns em redes sociais. A opinião pública está dividida entre aqueles que defendem o uso terapêutico e artístico dos bonecos, e aqueles que enxergam neles um reflexo preocupante de distorções emocionais e éticas. Outros defendem a liberdade criativa e o aspecto lúdico, desde que haja transparência sobre o que é realidade e o que é encenação.

E agora?
A polêmica em torno dos bebês reborn reflete uma sociedade que vive entre o afeto, o consumo e os limites éticos da representação. Seja como arte, terapia ou entretenimento, o uso desses bonecos ainda exige discussão madura, regulamentação e responsabilidade, especialmente quando envolve públicos sensíveis como crianças e pessoas em situação de fragilidade emocional. O debate vai além dos bonecos em si: trata-se de como lidamos com o afeto, o luto, a carência, e até com a infância enquanto construção social.

Com a popularidade dos reborns em alta, a tendência é que o debate continue ganhando força. Com casos inusitados e decisões judiciais batendo à porta, os reborns deixam de ser apenas bonecos. Tornam-se espelhos de um tempo em que a linha entre o real e o imaginário parece cada vez mais sutil — E, como toda questão complexa, ele exige uma abordagem equilibrada, debate sério e responsabilidade — que reconheça o valor artístico e terapêutico, mas não ignore os riscos e excessos.

O universo dos bebês reborn está longe de ser apenas uma curiosidade. Ele levanta questões profundas sobre afeto, consumo, fantasia e responsabilidade.





Thamyris Nagell

Bacharel em Direito, pós-graduada em direito público, Master in Business Administration (MBA) em Liderança, Inovação e Gestão 4.0. Coordenadora Legislativa e Coach de Imagem e Perfil, e certificada como entrevistadora social. Atuou em coordenação, estratégia, e gestão administrativa e política na área pública e privada, com larga experiência em gestão pública na elaboração de políticas públicas e projetos sociais e no desenvolvimento do terceiro setor. Conhecimento técnico em processos internos da área pública e privada, incluindo a relação com atores da sociedade civil e grupos de interesse. Bem como em gestão pública voltada para projetos críticos na área de empreendedorismo, educação, e em campanhas de combate à fome. Possui visão aguçada para as questões sociais e para a melhoria da qualidade de vida da população. Atuou na articulação legislativa entre organizações da sociedade civil e o poder público.

Thamyris Nagell

Bacharel em Direito, pós-graduada em direito público, Master in Business Administration (MBA) em Liderança, Inovação e Gestão 4.0. Coordenadora Legislativa e Coach de Imagem e Perfil, e certificada como entrevistadora social. Atuou em coordenação, estratégia, e gestão administrativa e política na área pública e privada, com larga experiência em gestão pública na elaboração de políticas públicas e projetos sociais e no desenvolvimento do terceiro setor. Conhecimento técnico em processos internos da área pública e privada, incluindo a relação com atores da sociedade civil e grupos de interesse. Bem como em gestão pública voltada para projetos críticos na área de empreendedorismo, educação, e em campanhas de combate à fome. Possui visão aguçada para as questões sociais e para a melhoria da qualidade de vida da população. Atuou na articulação legislativa entre organizações da sociedade civil e o poder público.

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